[Misbehaviors]

"Nothing can come of nothing."

01:52

Gluttony.

Postado por Uncool |

The Reverse.


"Gula. Ensandecida, louca.
Ela engoliu-me todo
com sua faminta boca."
(Rogério Viana)

E assim começa, quando deixamos de ter fome. Com Alice não foi diferente...

Alice, 21 anos, modelo, magérrima e subnutrida. Não tinha muitas variações em suas refeições: Sementes de girassol, painço, gergelim e uma folha de alface. Tudo reduzido ao mínimo, para que sua vontade bestial não se manifestasse, acabando com a sua carreira insutidada nas passarelas de Paris e Milão.

Era mantida sobre extrema vigilância: Nunca ficava sozinha, jamais era deixada próxima de coisas que pudessem ser roídas, mastigadas ou ingeridas. Sempre após comer os seus 150 gramas de comida, fumava cigarros franceses sem filtro, porque alegavam que queimava todas as calorias adquiridas na refeição. Não poderia ser de outra forma, já que faltavam forças para caminhar. Somente no dia dos desfiles da alta costura que existia o luxo de dobrar o peso da refeição, a fim de garantir que a fraqueza não atrapalhasse a performance.
Mas algo a consumia...

O que a consumia não era bem a fome, era o seu próprio organismo, lutando pela sobrevivência; lutando desenfreadamente para manter-se em harmonia, mas o estômago exigia cada vez mais, tornando toda e qualquer ação e/ou movimento, no mínimo fatal. O racional já estava reduzido às suas raízes primitivas. O instinto de sobrevivência estava deveras acionado: funcionava como uma bomba relógio em contagem regressiva, prestes a devastar tudo no perímetro corporal.

O embate entre a razão e o fisiológico é mais antigo que o homem. E mais uma vez, ocorria, mas ocorria de forma violenta, deixando marcas, tanto físicas quanto psicológicas. Alice sentia vontade de comer, mas ao mesmo tempo era forçada que isso era realmente um pecado, tanto no sentido religioso quanto no sentido profissional e corporal. E é nesse momento, que além do embate razão x fisiológico, existia o embate razão x emoção, sendo esse o responsável pelo peso na consciência de não ceder à tentação dos prazeres da carne, e seguir a vida como se isso fosse algo totalmente contrário às leis ditas como obrigatórias para uma vida saudável.

Em um dia nublado, Alice cedeu as tentações e o embate foi resolvido: A razão entrou em acordo com o fisiológico e o emocional ouviu a voz da razão, para o bem do organismo e a maldição e condenação do corpo físico.

Após uma tentativa frustrada de roubar algumas frutas no camarim durante um desfile em Roma, Alice foi submetida a um isolamento, e alimentada somente com água e folhas de boldo. Foi nesse momento que o instinto de sobrevivência, prezando pelo que é nomeado, agiu. A fome pantagruélica há tanto tempo guardada foi despertada, como um gigante adormecido.

Além do estomâgo consumir todas as proteínas do corpo e devorar a si mesmo, devido a inanição, Alice começou lentamente a se canibalizar. Iniciou pelos pés...

Devorou cada dedo como se fossem trufas recheadas dos mais deliciosos licores, rompendo as nervuras e os ligamentos como se fossem pedaços suculentos de carne, saboreando cada naco vagarosamente, demonstrando medo de que o alimento terminasse.

Não havia dor... havia prazer, havia o desejo de continuar a se devorar, porque isso causava o extâse e espantava a agonia, de tanto ter se proibido de tais delícias. A partir daí, cada pedaço do corpo era experimentado com desejo: os antebraços, os joelhos, os pulsos, os seios... e cada nova mordida, uma nova sensação... sensação de fruta madura explodindo na boca e liberando o sumo que escorre pela garganta, e esse sumo, nada mais era do que sangue, que jorrava pelo corpo dilacerado levando ao nirvana aquele estômago insaciável, onde já se misturava os orgãos mortos, devido ao fisiológico, e os tão ricos alimentos conseguidos à base gula.

E assim Alice morreu lentamente, praticamente canibalizada, mas saciada e entregue ao arrebatamento do exageros da arte de comer bem.

1 Malcriações:

Anônimo disse...

Cintia
Isto sim é Breat Easton Elis
Total Psicopata

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